Por Frei Pilato Pereira
Quando apanhamos um papel para ler ou escrever, seja um jornal, um livrou ou uma folha qualquer, dificilmente refletimos sobre o impacto ambiental e social que o consumo de um simples papel pode causar. Se fossemos agir desta forma, diante de qualquer produto que utilizamos, seríamos consumidores conscientes, atendendo a uma obrigatória exigência do nosso tempo. Já que precisamos consumir, pelo menos, poderíamos agir de forma mais consciente e responsável.
Estamos tão acostumados com a face limpa e bela do papel, seja ele branco ou colorido. E esquecemos de ver o seu outro lado, a face suja do papel que destrói a beleza da vida e explora as pessoas e a natureza. Como diz o ditado, "o papel aceita tudo". Mentiras e verdades são impressas no papel do jornal, da revista e do livro. Até podemos ler as mentiras, mas não devemos deixar de querer conhecer as verdades, por mais inconvenientes e adversas que sejam. E são muitas as verdades que estão para serem lidas no outro lado, no verso do papel. O lado escondido da produção e do consumo do papel.
A matéria-prima básica da indústria do papel, a celulose é um material fibroso presente na madeira. Em seu processo de fabricação, depois de descascada e picada em lascas, a madeira passa a ser cozida com produtos químicos, para separar a celulose da lignina e demais componentes vegetais. A etapa posterior, o branqueamento da celulose, é um processo que envolve várias lavagens para retirar impurezas e clarear a pasta que vai ser utilizada para fazer o papel.
Esses compostos, classificados pela EPA, a agência ambiental norte-americana, como os mais potentes cancerígenos já testados em laboratórios, também estão associados a várias doenças do sistema endócrino, reprodutivo, nervoso e imunológico. Mesmo com o tratamento de efluentes na fábrica, as dioxinas permanecem e são lançadas nos rios, contaminando a água, o solo e conseqüentemente a vegetação e os animais, inclusive os que são usados para consumo humano. No organismo dos animais e do ser humano, as dioxinas têm efeito cumulativo, ou seja, não são eliminadas e vão se armazenando nos tecidos gordurosos do corpo.
A Europa já aboliu completamente o cloro na fabricação do papel e o branqueamento é feito com oxigênio, peróxido de hidrogênio e ozônio. Mas nos Estados Unidos e no Brasil, e em favor de interesses da indústria, o dióxido de cloro continua sendo usado. É importante lembrar também que três grandes empresas de celulose estão se instalando no Rio Grande do Sul, onde pretendem plantar um milhão de hectares de arvores exóticas para a indústria de papel, da qual exportarão mais de 95% do produto. Isto significa que os restos tóxicos e os tocos das árvores ficarão por aqui causando irreparáveis impactos socioambientais.
O monocultivo de eucaliptos e outras plantas exóticas que alimentam a indústria de celulose e papel, além de causar sérios problemas ambientais, também aumentam a concentração da terra, expulsando agricultores e comunidades nativas, o que resulta em vazios populacionais. Esta atividade dificulta o processo de Reforma Agrária, não gera emprego e diminui postos de trabalho. E depois de duas safras de eucaliptos, por exemplo, após 14 anos, estas empresas nos deixarão de herança um Pampa devastado e sem vida, virado em tocos, sem rios, sem fauna e flora nativas.
Desde o plantio de árvores para a matéria-prima, até o fim de seu processo industrial, o papel segue um caminho causador de degradação socioambiental. O papel parece ser um produto indispensável. Nossa civilização não saberia viver sem papel. Mas podemos escrever e ler em papel ecológico. Temos o papel não embranquecido, aquele que não passou pelo processo de branqueamento e por isso poluiu muito menos e o papel reciclado que não precisou de mais uma árvore para ser produzido. Também podemos utilizar menos papel, nos re-educando para sair da cultura do descartável. Enfim, é preciso consumir o mínimo necessário e usar papel ecológico. A natureza e as gerações futuras desde já nos agradecem.