quinta-feira, 26 de março de 2009

Continuidade do Fórum Social Mundial 2009

Um grupo de participantes do Fórum Social Mundial, que ocorreu em Belém do Pará, no mês de janeiro de 2009, assumiu o compromisso de seguir mantendo contato e se encontrando para, além de cultivar as amizades, avaliar a caminhada de lutas por um "outro mundo possível" e também para compartilhar com outras pessoas a experiência do Fórum Social.

E quem acredita num "Outro Mundo Possível", urgente e necessário, onde a Paz e a Justiça andam de mãos dadas, também sente o compromisso de ser instrumento de Justiça e Paz. E quando se luta para que Justiça e a Paz andem de mãos dadas, é preciso seguir a luta de mãos dadas também. Para isso sempre é bom um reencontro que ajude a resgatar as raízes, revigorar e comungar os sonhos e fortalecer a esperança, as convicções.

Com estes objetivos um grupo de militantes socioambientais que participaram do Fórum Social Mundial 2009, em Belém do Pará, decidiu se reencontrar. E o primeiro reencontro aconteceu na Comunidade da Pedra Grande, no município de São Pedro do Sul. O evento, que ocorreu nos dias 21 e 22 de março, não foi apenas entre os participantes do Fórum, mas com massiva participação da comunidade local.

A programação foi a seguinte:

Manhã de Sábado, dia 21 de março: Recepção Altermundista

Tarde na Comunidade: Oficinas Temáticas com participação Popular

  1. Ecologia e Espiritualidade – Responsável: Frei Pilato Pereira;
  2. Construção de Cisternas e o Novo Modo de Viver – Responsável: Zeca da CPT;
  3. A experiência da Agroindústria na Agricultura Familiar, com Perci
  4. A Economia Popular Solidária, com Miriane
  5. Cultura Guarani – Responsávei: Luciméia Gall Konig;

No final da tarde teve a celebração da Missa com a Comunidade, seguida de Noite cultural e jantar de confraternização.

No Domingo, 22 de março, Dia Internacional da Água, o encontro seguiu com um roteiro turístico, cultural e histórico no município de São Pedro do Sul.

No local do encontro tem uma grande pedra com algumas inscrições indígenas que nunca foram traduzidas. E os participantes do reencontro saíram impressionados com a riqueza histórica e cultural que representam as inscrições indígenas na pedra que está preservada como sítio arqueológico. Para os militantes do Fórum Social Mundial as inscrições indígenas, até então indecifrável, poderão ser lidas por corações e mentes que tenham a humildade de interpretar o que há de sagrado nas letras e símbolos que os irmãos indígenas deixaram para ser lido com um olhar de respeito, reverência, amor e compromisso com a vida.

Para o grupo que foi até a Pedra Grande se reencontrar com os companheiros e companheiras, o Fórum Social Mundial não ficou nem terminou em Belém do Pará. O Fórum continua. E todos e todas fazem parte desta história revolucionária que se abre para um futuro de Justiça, Paz e Integridade da Vida. Um futuro que não apenas virá, mas já está sendo gestado. Esta é a convicção dos participantes do Fórum Social Mundial 2009, reunidos em São Pedro do Sul nos dias 21 e 22 de março.

 

quarta-feira, 18 de março de 2009

Dia Internacional da Água - 22 de março

Água é fonte de vida e não de lucro


O Dia Internacional da Água é celebrado em 22 de março e o ano de 2003 foi também instituído pela ONU como o Ano Internacional da Água. Isto é um reconhecimento oficial de que a água é um bem precioso para as nações e todos os povos da Terra. O dia 22 de março, bem como a semana da água, é um momento para se fazer alguma discussão sobre os diversos temas relacionados à água. Visto que a situação da água é bastante preocupante em todo o planeta, é preciso um momento de reflexão, análise, conscientização e busca de alternativas práticas para resolver os problemas que foram surgindo ao longo da história por causa de ações equivocadas do ser humano.


E se for falar dos problemas relacionados com a água, temos muito que denunciar. Por exemplo, hoje se tem informação de que cerca de 20% da humanidade não possui água para uma vida normal. E a previsão é de que em 2025, dois terços da população viverá em áreas onde as reservas de água serão limitadas. Temos um dado muito preocupante com relação à saúde. Estima-se que 80% das enfermidades no mundo são contraídas por causa da água poluída. E água poluída, além de causar doenças nas pessoas, também causa mal para toda a natureza, pois, cada metro cúbico de água poluída jogada num rio contamina entre 8 a 10 metros cúbicos de água limpa. Também sabemos que na América Latina e Caribe, os aquíferos estão sendo explorados de forma insustentável para fins domésticos, industriais e agrícolas. A água simplesmente está virando mercadoria.


Também é preocupante a forma de como as pessoas consomem a água no seu cotidiano. Um banho de ducha de alta pressão consome 135 litros de água em apenas 15 minutos, uma mangueira aberta por 30 minutos libera cerca de 560 litros e uma torneira aberta por 5 minutos permite a vazão de 80 litros de água. Percebemos que a água é vítima da degradação, do desperdício e do interesse econômico do mercado que quer se aproveitar do discurso da escassez para transformar a água em mercadoria. Temos que ter todo cuidado para com a preservação da água. Este precioso bem que a natureza nos oferece deve ser protegido hoje da ambição dos capitalistas que vêem a água como uma fonte de lucro para o mercado. Quando na verdade, a água é uma fonte de vida e dignidade para toda a humanidade.


Precisamos estar atentos quando se fala em crise da água, porque há nisso um tanto de realidade e outro tanto de ideologia. Também se deve ter atenção com o que está por traz de alguns discursos sobre a escassez, que é o interesse de transformar a água em mercadoria. Junto com o risco da privatização, também existe o real perigo da escassez. Mas a escassez de água vem da degradação e do desperdício. O problema é a forma de como nos relacionamos com a água.


Pensando bem, a água é uma questão de justiça e paz para a humanidade. É um bem comum, um direito de todos, é um dom de Deus para nutrir a vida. A água é o sangue da Terra, é uma questão de vida ou morte da humanidade e de todos os seres e formas de vida no Planeta.


Sabemos que a água não está igualitariamente distribuída em todas as partes do mundo. A natureza nos oferece água gratuitamente, mas requer um gerenciamento por parte do ser humano. E este gerenciamento da água, até passa por um processo econômico porque depende do trabalho, de investimentos de recursos, mas deve ocorrer na lógica da solidariedade e não na lógica do mercado, que em tudo visa o lucro.


A garantia universal do acesso à água depende da responsabilidade de todos e da solidariedade entre pessoas e povos. É uma vergonha e uma ofensa à nossa humanidade e racionalidade o fato de se fazer guerras por causa da água. Não podemos disputar a água, devemos sim nos solidarizar uns com os outros na garantia desta fonte de vida.


Concluo esta breve reflexão sobre a água com um refrão do Cântico do Irmão Sol, de São Francisco de Assis: "Louvado sejas, meu Senhor,/ Pela irmã Água,/ Que é muito útil e humilde/ E preciosa e casta."


Frei Pilato Pereira

www.olharecologico.blogspot.com

terça-feira, 10 de março de 2009

O manifesto profético das mulheres da Via Campesina

O manifesto profético das mulheres da Via Campesina

 
Quando uma mulher, seja mãe, irmã, amiga ou, para os casados, a esposa ou uma companheira de trabalho, enfim, quando uma mulher nos chama a atenção para alguma coisa que está errada, nem sempre nossos preconceitos nos permitem ter a devida compreensão. Ainda meninos, quando nossa mãe nos alertava de algo que representava perigo, nem sempre tínhamos a humildade de reconhecer a razão da mulher que queria nos proteger e garantir nossa vida. Não sabíamos que as mulheres têm um sexto sentido ou articulam tão bem os cinco sentidos que conseguem captar, compreender muito além dos nossos olhos e das nossas percepções. Pelo pouco que conheço das mulheres, especialmente pela convivência com minha mãe, sei com toda a certeza, que elas geralmente estão sempre atentas e preocupadas com a vida. E é normal muitas vezes a mulher colocar sua própria vida em risco para defender a vida do filho ou de outra pessoa. E parece também que as mulheres têm os olhos fitos no futuro e, com os pés no chão, conseguem alertar para futuras consequências de certos atos do presente.

 

Desde 2006, as mulheres da Via Campesina nos alertam para o perigo que representam as monoculturas de plantas exóticas como, por exemplo, os eucaliptos. No Dia Internacional a Mulher de 2006, enquanto muitas mulheres, recebendo homenagens, felicitações ou presentes, se consolavam de uma longa trajetória de machismos, preconceitos e violência, outras resolveram agir. Foram as mulheres organizadas pela Via Campesina que ocuparam o horto florestal da Aracruz Celulose no Rio Grande do Sul. E a ação delas era uma reação perante esta história de violação da vida. Ao longo da nossa história a vida sempre foi violentada em nome do progresso e do desenvolvimento. Por isso, a reação das mulheres em defesa da dignidade humana e da integridade do meio ambiente, se deu num lugar que simbolizava este progresso destruidor e sem perspectiva de vida. E com o ato de oito de março de 2006, o Dia Internacional da Mulher se tornou muito mais simbólico. É, pois, um dia de luta, um dia de alerta, de mostrar para a sociedade onde a vida realmente está ameaçada e quem são os agentes de tais ameaças.

 

Agora, em 2009, as mulheres da Via Campesina ocuparam uma área de terra no sul do Estado gaúcho e mais uma vez denunciam os malefícios provocados pelas monoculturas de plantas exóticas, pelo agronegócio e pelas multinacionais invasoras. Mas, será que a sociedade vai ter suficiente bom senso para ouvi-las ou ainda está vendada com o véu imposto pela grande mídia? O alerta das mulheres da Via Campesina deve percorrer o mundo como uma palavra profética e libertadora.

 

Elas denunciam claramente que na fronteira do Brasil com Uruguai, nos municípios de Candiota e Aceguá tem uma área da Votorantin Celulose e Papel com 48 mil, quase 50 mil hectares de terra com monocultivo de eucalipto para a produção de celulose para exportação. E elas, com sabedoria e autoridade, denunciam que se trata de um empreendimento que não paga impostos, destrói a terra, contamina o lençol freático por conta dos agrotóxicos, seca rios e nascentes numa região historicamente marcada por sucessivas estiagens. E além dos terríveis danos ambientais, vem causando danos às pessoas com desemprego e péssimas condições de trabalho.

 

Para se ter uma ideia do que representa negativamente o cultivo de eucaliptos nas terras da Votorantin, vamos olhar e comparar com uma área de assentamentos da Reforma Agrária na mesma região e com alguns hectares a menos. Em Hulha Negra, Candiota e Aceguá, a área de Reforma Agrária corresponde a 45 mil hectares de terra e deu lugar para 1.860 famílias viverem com dignidade do próprio trabalho. E estas famílias estão organizadas em 46 comunidades, onde, na maioria delas, se reúnem semanalmente para as celebrações e o lazer, como também para debater e planejar a produção e organizar a vida social. O local possui hoje 16 escolas, onde estudam 1.260 crianças e jovens. E para citar alguns dados da produção, é importante dizer que as famílias assentadas na região produzem: 50mil kg de mel por ano, 1 milhão de litros de leite por mês, 15 toneladas de trigo por ano, além de galinha, porco, peixe, cebola, amendoim, milho, linhaça, sorgo e etc. No local existem 2 moinhos para milho, trigo e arroz e 4 cooperativas de produção e trabalho. Uma das cooperativas produz sementes agro-ecológicas, tendo uma produção de 100 toneladas por ano. Também tem duas emissoras de rádio comunitária e um ginásio de esportes.

 

Em síntese, quase duas mil famílias vivem dignamente na região e não precisam pedir esmolas, nem disputar os poucos empregos oferecidos nas cidades. E seus filhos estão mais distantes dos perigos da violência e das drogas que existem no mundo urbano. As pessoas levam uma vida digna, se alimentam bem e cultivam valores que em grande parte a civilização urbana vem perdendo. Entre o monocultivo de plantas exóticas, o agronegócio das multinacionais e a Reforma Agrária e Agricultura Familiar, existe uma grande diferença, que é a dignidade humana e a preservação do meio ambiente. Nossos governos vem fazendo opções contraditórias quando investem pouco ou nada na Agricultura Familiar e liberam grandes volumes de dinheiro para estas multinacionais e empresas do agronegócio que não produzem alimentos, não geram empregos e ainda destroem o meio ambiente. Espera-se que a sociedade compreenda o profético manifesto das mulheres da Via Campesina no Sul e passe a somar forças na luta em defesa da vida.

 

Frei Pilato Pereira

 

 

domingo, 8 de março de 2009

8 de Março: o clamor da Terra

8 de Março: o clamor da Terra


8 de março, o Dia Internacional da Mulher. E para celebrar esta data, poderíamos dar uma flor a, pelo menos uma mulher, porque mulheres se alegram com flores. Elas e todos nós vemos nas flores muita simbologia de vida e sentimentos. Uma flor para alegrar o coração de uma mãe, uma esposa, uma filha, uma companheira. Enfim, uma singela flor, com ternura e amor ou com qualquer outro sentimento verdadeiro e livre, já seria um grande gesto de reconhecimento do valor e do significado humano da Mulher. Mas, pode chegar o dia em que as flores não terão um palmo de terra livre e fértil para germinar sua semente e crescer com sua beleza. Pode ser que alguns homens (e algumas mulheres sem coração de mulher), um dia tenham preenchido todos os espaços da Terra com o progresso e o desenvolvimento. Pode ser que as plantas exóticas, que servem para fazer papel descartável, que geram lucro e riquezas de poucos, cheguem a invadir completamente os espaços de vida, ao ponto de as flores serem sufocadas e desaparecerem.


Mas, Deus se preveniu com a defesa da vida que criou. E depois que fez todas as coisas, Deus criou a mulher. Não para ser a última, mas para dar sentido e vida a tudo o que Ele fez. E as mulheres têm muito forte em si, como um distintivo próprio, o instinto de preservar a vida, sempre, de qualquer ameaça. E pensando assim, compreendemos os atos de muitas mulheres, sejam atos isolados ou coletivos. Compreendemos, por exemplo, porque as mulheres da Via Campesina reagiram com tamanha energia física e moral contra as plantações de eucaliptos no Rio Grande do Sul. Analisando o grande malefício político, social, econômico e ambiental que as monoculturas de árvores exóticas, como o eucalipto, podem nos causar, então compreendemos perfeitamente o valor da ação das mulheres em 8 de março de 2006 e outras ações posteriores. É compreensível que as mulheres coloquem suas próprias vidas em risco para defender a vida de hoje e o futuro da vida.


Mas, preservar a Terra não é um dever apenas das mulheres. Elas, com o sentimento materno, nos convocam com o seu testemunho a defender e preservar a vida. É preciso que todos nós correspondamos aos apelos que as mulheres vem fazendo nos últimos anos no sentido de articular as lutas em defesa da dignidade humana e a preservação ambiental. A partir de 2006, o Dia Internacional da Mulher tem um significado a mais. Esta data passou a convocar toda a sociedade, as mulheres e os filhos de mulher, a lutar pela vida do Planeta Terra. Interpreto que as mulheres, num gesto profético, a partir do 8 de março de 2006, exclamaram, colocaram pra fora o clamor da Terra. Era um clamor emudecido, sufocado pela violência do capital. Mas foi exclamado por vozes e mãos corajosas de mulheres camponesas. E agora este clamor não se calará jamais, porque a Terra quer viver.


Frei Pilato Pereira